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DCM – Marinhos continuam sem punição por crime em Paraty

21/07/17 – Diário do Centro do Mundo
Exclusivo: Quem é o turista que denunciou o triplex da Globo e agora sabe que a lei não é para todos. Por Joaquim de Carvalho

 

 

 

Daniel Szames passeava de escuna pela baía de Paraty quando viu a praia de Santa Rita com uma construção ostensiva, boias que impediam o acesso, um deck de grandes proporções e a construção de três andares incompatível para região que é reserva da natureza, a Área de Proteção Ambiental (APA) de Cairuçu.

Ele queria parar na praia, mas o condutor da escuna informou que não poderia. No passado mais distante, quando a área pertencia a Francisco William Munhoz e sua irmã, Elizabeth, o acesso era livre, mas, depois que “um membro da família do sr. Roberto Marinho” comprou o sítio, a praia e um pedaço de mar foram “privatizados”, como se diz em Paraty.

Caso o barqueiro passasse pela barreira, ele não conseguiria entrar na praia, pois havia seguranças e cachorros que impediriam o desembarque.

Daniel, que é de Rio das Ostras e trabalha como técnico na Justiça Federal, não se conteve. Ele mandou um e-mail para o Ministério Público Federal e pediu providências.

“Além do relato dessa pessoa (o condutor da escuna), que toda semana passa pelo local, por conta do trajeto rotineiro do passeio de escuna, pude ver tudo o que estou informando. Lamentavelmente não pude fotografar o local, pois minha câmera estava com defeito. Acredito que, por se tratar de propriedade de uma família com tanta influência e poder econômico, muitos jornalistas, políticos e autoridades locais tenham temor de investigar o caso, porém é sabido que a lei tem de ser igual para todos. Necessário se faz, ao meu ver, uma diligência ao local”, escreveu.

Era setembro de 2009, houve diligências no local, através de técnicos ambientais do Instituto Chico Mendes, ligado ao Ministério do Meio Ambiente. A Polícia Federal abriu inquérito e, um ano depois, tiveram início dois processos – um criminal, por violação de leis ambientais, e outro civil, visando à demolição da casa, que já foi premiada pela beleza arquitetônica.

Mas, decorridos quase oito anos da denúncia, a mansão continua lá e os nomes da família Marinho desapareceram do processo. Nos documentos em cartório e no processo, aparecem registros de uma empresa brasileira, a Agropecuária Veine, controlada por uma empresa de Las Vagas, a Vaincre, por sua vez sob domínio de por offshores abertas no Panamá pelo escritório Mossack Fonseca, sem identificação dos reais proprietários.

São indícios veementes de ocultação de patrimônio, com finalidade de lavagem de dinheiro. No cartório de Paraty, onde foi assinada a escritura, o real proprietário é de conhecimento dos funcionários. Segundo um deles me disse, pertence à família de um dos donos da Globo, João Roberto Marinho, mas ele nunca apareceu lá para cuidar da documentação. Sempre foi seu genro, agora ex-genro, Alexandre Chiappetta Azevedo.

Quando fez a denúncia, Daniel pediu reserva quanto à divulgação do seu nome, mas ele aparece logo nas primeiras páginas do processo. Esta semana, eu o localizei e perguntei por e-mail se ele tinha arrependimento por ter feito a denúncia, já que, até agora, não houve nenhuma punição, e o tríplex continua lá, desafiando as autoridades ambientais.

“Arrependimento nenhum”, respondeu ele, apesar do caso mostrar que, ao contrário do que ele imaginava em 2009, quando fez a denúncia, a lei não é para todos.

“Eu só estava fazendo um passeio de barco na época ali no local e o barqueiro da escuna me explicou que aquela praia era pública, como qualquer outra da região de Paraty, e que, após a compra daquela casa, aquela família fechou o acesso à praia, colocando um deck enorme ali, como eu pude ver na hora, e cães ferozes e seguranças ali no deck”, afirmou.

Daniel não quis falar mais e também se referiu aos Marinhos como “aquele família”. O tríplex de Paraty é um dos símbolos de um Judiciário caracterizado por seletividade. Apenas a título de comparação: a denúncia a respeito do tríplex atribuído a Lula foi apresentada em setembro do ano passado e, dez meses depois, já existe condenação e sequestro de bens.

No caso da Paraty House, a Justiça Federal recebeu a denúncia há sete anos e não houvesse consequência mais severa. Sobrou para um arquiteto do Rio de Janeiro, que tem mais de 70 anos de idade. Numa transação penal, ele fez uma doação em produtos, no valor de pouco mais de 1.000 reais, para um asilo de Paraty. Já está quite com a Justiça.

A representante da empresa que tem a propriedade formal do sítio e da casa na praia de Santa Rita, uma senhora que também tem mais de 70 anos de idade, nunca prestou depoimento, apesar de intimada cinco vezes pela Polícia Federal e duas pela Justiça.

Numa das ironias do destino, a indicação de quem está por trás da empresa de fachada que tem a propriedade do imóvel foi parar na mesa do juiz Sérgio Moro, de Curitiba.

Ali aparece o nome de Paula Marinho, como responsável pelo pagamento das taxas de manutenção das empresas offshore – não por acaso, relacionadas no escândalo de lavagem de dinheiro conhecido como Panamá Papers.

Moro não demonstrou a mesma celeridade que tem apresentado no caso de Lula. Os papéis que relacionam Paula Marinho, filha de João Roberto Marinho, à Paraty House estão parados em algum escaninho entre a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e a 13ª Vara Federal de Curitiba.

O contador Jorge Luiz Lamenza, do Rio de Janeiro, foi quem abriu a empresa usada para a compra do sítio em Paraty. Eu também o localizei.

“Não sei quem estava por trás da empresa. Um escritório de advocacia me procurou e eu abri a empresa, num trabalho absolutamente profissional, acho que foi em 2006. Na época, era comum que o contador figurasse como representante, e foi isso que fiz. Hoje não faria de novo, pois agora está mais claro do que nunca que existe muita maldade. Você não sabe a finalidade da empresa”, disse.

A Veine, dona da Paraty House, é da família Marinho? “Não sei. Como disse, foi um advogado que me contratou para abrir a empresa. Quando houve inquérito na Polícia Federal, eu saí da empresa e hoje não tenho mais nenhum contato com esse escritório”, respondeu.

O escritório a que ele se refere é de Miguel Bechara Júnior, de São Paulo, que teve seu nome relacionado à abertura de empresas offshore pelo escritório da Mossack Fonseca em São Paulo.

Tudo isso passou pela mesa de Sérgio Moro, em Curitiba, pois a apreensão dos papéis da Mossack Fonseca foi autorizada por ele, quando a PF suspeitava que pudesse encontrar ali algo relacionado ao tríplex do Guarujá, que ele decidiu que pertence a Lula.

Moro não conseguiu provar essa propriedade, mas o condenou assim mesmo. Já a propriedade do tríplex de Paraty já está quase provada. Falta um pouco só de vontade de avançar na investigação. Mas parece não haver interesse na busca da verdade.

 

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