Sem organizar uma única manifestação contra a corrupção do governo Temer e militando ativamente pela desastrosa gestão do prefeito paulistano, o MBL segue firme na trilha da hipocrisia dos seu ídolos privatizadores. Depois de nascer e crescer com o discurso do apartidarismo, nossos jovens liberais resolveram tirar a máscara e entrar firme na política partidária.
O MBL está prestes a formalizar uma aliança para as eleições de 2018 com os “cabeças pretas”, uma bancada de jovens deputados tucanos que entrou para política através de laços familiares. Não são jovens da ala progressista tucana, pelo contrário. São conservadores, anti-esquerdistas ferrenhos. Apresentam-se como novidade, dizem estar conectados com as ruas, com as redes sociais, mas não passam de versões mais descoladas dos filhos do Sarney.
São jovens, mas não representam nenhuma novidade na política. Quase todos levam sobrenomes de famílias tradicionais no cenário político brasileiro. Bruna Furlan (SP) é filha de Rubens Furlan. Pedro Cunha Lima é filho de Cássio Cunha Lima. Pedro Vilela (AL) é filho de Teotônio Vilela Filho. Arthur Virgílio Bisneto (AM) é filho de Arthur Virgílio. E por aí vão os mandatários que mais parecem capitães hereditários.
A deputada Shéridan (PSDB-RR), por exemplo, teve na semana passada seus bens bloqueados pela justiça por improbidade administrativa. É que quando foi primeira-dama de Roraima, a jovem tucana utilizou um avião do estado para dar uma carona de volta ao Rio para Mc Sapão, que havia animado a sua festinha de aniversário de 26 anos.
Segundo um cabeça preta, a nova parceria tem como base “as ideias liberais de redução do Estado”, ou seja, estão unidos pela mesma velha tara privatizadora de sempre. Não há uma agenda inovadora. A aliança pretende lançar Kim Kataguiri do MBL para deputado federal, e cogitam até mesmo sair do PSDB caso for necessário. Mas, de olho em 2018, Tasso Jereissati quer segurar a rapaziada e já declarou ver com bons olhos a aproximação do MBL.
Hoje, o MBL já participa ativamente em diversas administrações tucanas, seja ocupando cargos, seja fazendo militância na internet. Em São Paulo, usa sua força nas redes sociais para defender o prefeito e atacar jornalistas que criticam a gestão, classificando todos como “esquerdistas”. O movimento já até faz pressão para que Doria abandone a prefeitura para ser candidato a presidente.
Na gestão Marchezan em Porto Alegre, o líder do MBL e empresário Renan Santos tem influência direta nas redes sociais do prefeito. A estratégia é a mesma usada em São Paulo: atacar ferozmente a esquerda, os jornalistas críticos, os sindicatos e o PT. A influência do MBL em Porto Alegre vai além das redes sociais. Lançado como “candidato oficial do MBL”, Ramiro Rosário (PSDB) foi nomeado secretário de Serviços Urbanos.
Assim como na capital gaúcha, o MBL tem abocanhado diversos cargos comissionados em outras cidades do país. Logo eles, que sempre militaram contra o loteamento de cargos públicos, passaram a aceitar as boquinhas numa boa. Parece que tudo muda quando se sai da arquibancada para entrar em campo e jogar. O grupo nega participar de cabide de empregos e garante que todos os nomeados têm perfis técnicos, mas isso é tão verdadeiro quanto as cidadanias que Doria tem recebido pelo Nordeste.
O mandato de Fernando Holiday em São Paulo, por exemplo, faz pouco além de atacar o PT e o PSOL. A principal bandeira do vereador é a promoção do famigerado Escola Sem Partido, um projeto estúpido e autoritário que já foi considerado inconstitucional pelo STF. Para não dizer que o mandato do jovem se resume a isso, destaco medidas populistas que não renovam em nada a prática política, mas bombam no Facebook, como doação de parte do salário para entidades carentes e outras tolices puramente demagógicas.
Em nota, a Juventude do PSDB, que esteve firme ao lado do MBL nas manifestações a favor do impeachment de Dilma, rechaçou a aliança dos “cabeças pretas” com o movimento:
Em nossa leitura, o MBL como movimento político teve importante papel no processo de impeachment da ex-Presidenta Dilma Rousseff, mas, hoje, tem sua agenda esgotada e não se observa mais utilidade a essa organização que, aliás, nunca deixou clara sua origem, seu funcionamento e, principalmente, seu método de financiamento. Não à toa, o movimento adota como prática a intimidação e a ridicularização dos seus adversários políticos, quando não da própria imprensa que ousa questionar suas falácias e hipocrisias.
O método de financiamento não é tão desconhecido assim. O MBL é financiado por uma rede de think tanks liberais dos EUA, obteve ajuda financeira de PMDB, PSDB e Solidariedade para bancar as manifestações pelo impeachment de Dilma e, ainda assim, passa o chapéu nas redes sociais pedindo um trocado.
A ligação com partidos políticos sempre existiu, mas havia ainda um certo pudor em assumir isso para não comprometer o discurso mentiroso do apartidarismo. Com a eleição de oito dos seus 45 candidatos nas últimas eleições, o MBL passou a integrar a política institucional aliada com o que há de mais velho nela.
Ronaldo Caiado (DEM), Pauderney Avelino (DEM), Darcísio Perondi (PMDB), Iris Rezende (PMDB), Mendonça Filho (Ministro da Educação) e Gilmar Mendes são alguns dos nomes da política – sim, Gilmar Mendes é um nome da política – com os quais o MBL tem bom relacionamento. A ligação com o ministro do STF é ainda mais próxima. Diferente dos outros ministros do Supremo, Gilmar quase nunca é criticado pelo grupo. Pelo contrário, no Twitter do movimento, há muitas postagens em defesa do ministro.
Além de o tratarem como “mito”, colocando óculos escuros no ministro, Kim Kataguiri e Fernando Holiday ganharam bolsas para estudar na IDP, de propriedade do ministro. Nesta semana, com as estripulias de Gilmar Mendes indignando gregos e troianos, o MBL ensaiou uma crítica bastante tímida ao ministro no Facebook, mas nada significativo a ponto de estremecer essa relação bonita. Para eles, Gilmar “parece ter perdido todo o bom senso e agora atua de maneira questionável libertando criminosos”. Para quem está acostumado com o estilo agressivo e lacrador do MBL nas redes, isso é quase um cafuné.
Aproveitando o vácuo da crise de representatividade e sua forte presença nas redes sociais, o MBL vai aumentando a influência dentro da política partidária e pretende surfar o revival neoliberalista de Temer e Doria. O grupo já tem atuado como partido político, lançando candidatos, fazendo alianças e ocupando cargos públicos. Tudo isso é legítimo. O problema é a hipocrisia de quem vende renovação na política, mas permanece intimamente atrelado às figuras mais jurássicas da política nacional e preso aos mesmos vícios da politicagem que tanto criticam. Portanto, não se enganem. Ali o novo já nasce velho.